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MILLENNIUM BCP NO MUNDO DO CRIME...

sexta-feira, 11 de julho de 2008

Carlos Tavares não faz "jeitos a ninguém"...


Sabem que não dou o jeitinho”

Como é que avalia o trabalho da comissão de inquérito à supervisão, no âmbito do caso BCP?
A CMVM só tem de respeitar e colaborar como tem feito para que a comissão preencha o melhor possível os seus objectivos. Penso que a sua existência é útil, num caso muito mediático e no âmbito do qual se questionou se os supervisores poderiam ter feito mais. Trata-se de um caso importante para o sistema financeiro português. Devíamos tirar dele todas as ilações para que não se repitam situações deste género.

Que situações?
Aquelas que constam no comunicado que o BCP fez a 23 de Dezembro e que correspondiam às nossas conclusões preliminares. Na altura, já sabíamos que eram válidas mas hoje estão suportadas juridicamente, documentadas e estamos a falar de situações que não devem existir no sistema bancário.

Como se sente um regulador a ser avaliado pela AR?
Digo com sinceridade que gosto sempre de ir ao Parlamento, independentemente de se tratar desta comissão de inquérito, porque penso que é útil que os deputados possam ser informados de viva voz daquilo sobre o que fazemos. Esclareço tudo o que for possível, no respeito pelo segredo profissional e pelo segredo de justiça.

Para além da questão informação, a comissão de inquérito servirá para mais alguma coisa?
Servirá para aquilo que os senhores deputados quiserem. Não sou eu que tenho de dizer para que serve a comissão. Creio que tem, pelo menos, uma grande utilidade, a de discutir os meios que tem a supervisão, o próprio modelo de supervisão e, por exemplo, se o enquadramento legal, do ponto de vista das medidas de dissuasão e sanção é o adequado. Não quero, de forma alguma, antecipar as conclusões, mas a comissão pode entender que os supervisores precisam de mais meios para actuar, ou que é preciso criar um quadro sancionatório mais dissuasor. Mas não quero antecipar as conclusões da comissão.

Consegue entender a opinião daqueles que defendem que esta comissão tem sobretudo finalidades políticas?
Não quero sequer admitir que os deputados pudessem ter essa postura.

Os crimes de mercado deviam prever a de prisão efectiva?
Tenho vindo a defender uma harmonização das sanções a nível europeu porque há uma grande dispersão do quadro sancionatório que pode ser aproveitada pelos prevaricadores potenciais. Há uma grande diversidade de quadros sancionatórios e o nosso estará, neste aspecto, a meio da tabela. Nos crimes de mercado, há países que impõem penas de prisão efectiva maiores que as nossas. Em Portugal, estão previstos três anos, mas a pena pode ser substituída por multa e como sabe entre nós não há nenhum caso com imposição de pena de prisão efectiva. E as próprias sanções têm sido relativamente brandas.
Porquê?
Isso é critério dos juízes. Acho que devem comparar-se as sanções impostas a estes crimes a outras resultantes da prática de outros crimes.

É um problema de quadro legal ou da sua aplicação?
É sobretudo de quadro legal. Em muitos países o que funciona como principal sanção é a perda da vantagem adquirida. No nosso caso, prevê-se a perda a vantagem adquirida, mas em singelo, ou seja, apenas nesse valor. Há casos de outros países em que pode haver uma perda de até 10 vezes aquilo que se ganhou e isso já é um risco grande.

Mas defende ou não que haja prisão efectiva para os crimes de mercado?
Para os crimes de mercado especialmente graves. Penso que é mais dissuasor. Mas também admito, sei aliás que há quem o defenda, que possa nalguns casos haver simples contra-ordenações, o que tornaria o processo naturalmente mais rápido. Isso acontece em alguns países, mas na maior parte dos países da Europa, o abuso de informação privilegiada e a manipulação de mercado são crime.

Existe falta de sensibilidade dos juízes e dos magistrados do MP para este tipo de casos?
Penso que, com a sofisticação do mercado e dos próprios agentes, torna-se cada vez mais difícil o tratamento destes casos. Mas a sensibilidade que tenho encontrado por parte do MP é bastante grande. Tenho encontrado também uma abertura muito grande para uma colaboração da CMVM dentro da sua especialização. Cada um tem de conhecer das suas coisas, nós aqui também não temos especialização em muitos aspectos do processo penal, por exemplo.

Mas a obrigação dos juízes não é ter competências nas matérias dos casos que estão a julgar…
Ter competências ou ter o conhecimento que lhes seja fornecido. Essas condições existem e é uma questão de vontade. Tenho assistido, da parte do MP, vontade e abertura para esse efeito.
No caso do BCP, a CMVM encontrou claros indícios de manipulação de mercado e o ‘dossier’ já foi entregue ao MP. A relação com o MP correu bem?
A melhor possível, óptima. Ainda estamos numa fase inicial, o ‘dossier’ foi entregue muito recentemente, mas nestes primeiros contactos tenho presenciado esta dupla boa vontade de colaboração. São assuntos muito específicos, com elevado nível de sofisticação e uma tecnicidade muito grande. Só tenho a dizer que estamos plenamente satisfeitos com aquilo que se tem passado.

Conseguiria compreender facilmente se o MP não chegasse a uma acusação no caso BCP?
Essa é uma possibilidade que existe sempre. Se pretendêssemos sempre garantir que haveria sempre acusações não entregaríamos processo nenhum porque há sempre a possibilidade de não se conseguir as provas exigidas pelo nosso sistema penal. Estamos a falar de um crime onde a prova é muito mais exigente e os meios de defesa também são muito mais intensos. Por estas razões e até por razões de prescrição, temos que atender que alguns destes factos se passaram há vários anos.

O risco de prescrição é grande?
Não lhe posso antecipar, nem num sentido nem noutro. É algo que tem agora que ser avaliado. Depende também da configuração da moldura dos crimes.

Mas ficaria desiludido ou surpreendido se não houvesse uma acusação?
Depende das razões. A única coisa que não queria é que isso acontecesse por a CMVM não ter feito bem o seu trabalho. Se isso acontecer por qualquer outra razão…

A CMVM está, neste momento, plenamente convicta de que o seu trabalho foi bem feito e que todos os elementos reunidos conduzem à forte suspeita de que houve um crime?
Se não fosse assim não teríamos feito a comunicação ao MP. Só entregamos estes relatórios quando existem esses indícios. É algo sério de mais para que não tenhamos elementos suficientemente seguros.

É possível que em todos os documentos analisados a assinatura do engº Jardim Gonçalves não apareça em lado nenhum?
Não posso entrar nessas considerações.

Porque é que a CMVM não quis ouvir o engº Jardim Gonçalves e o dr. Paulo Teixeira Pinto?
No limite, não precisamos de ouvir ninguém no âmbito das nossas tarefas de averiguações preliminares. Temos que colher factos, essencialmente. Não fazemos o julgamento, não fazemos a instrução do processo. Terão de ser ouvidos algum dia, na fase seguinte, eles ou quem quer que seja. No nosso trabalho, quer na área das contra-ordenações quer no processo de manipulação de mercado, no limite não temos de ouvir pessoas, a não ser para nos ajudar a conhecer e fundamentar os factos. E para isso, ouvimos as pessoas que julgámos necessário ouvir.

Não teria sido útil ouvir o presidente do BCP à altura dos factos investigados?
Como disse, trabalhamos com factos. Conhecemos os factos, que estão documentados. Os documentos foram suficientes, ouvimos algumas pessoas, também, mas não ouvimos todas as pessoas do banco…

Falamos do fundador do banco e não de todas as pessoas do BCP.
Para o nosso trabalho não é relevante a sua posição. Ouvimos quem entendemos ouvir, dada a participação que as pessoas poderiam ter tido nos processos. E ouvimos poucas pessoas. Para as nossas conclusões, os documentos eram suficientes, bem como os testemunhos que recolhemos.

Há um lado objectivo, o dos documentos, e outro subjectivo, que é o de saber quem fez e com que intenção. Neste capítulo, não teria sido útil ouvir as pessoas?
Não, porque não é essa a nossa função. Temos que tirar destes processos uma de duas consequências: ou em causa está uma contra-ordenação, que é normalmente contra uma instituição, ou então, trata-se de crimes, cujos factos e análise da CMVM são remetidos para o MP. No primeiro caso, são as instituições que indicam quem deve ser ouvido. Nos crimes de mercado, cabe ao MP fazer esse julgamento.

E com o Banco de Portugal, como tem corrido a articulação neste caso?
Tem sido boa. Temos feito a condução do processo de forma articulada, cada um com as suas competências, e temos mantido uma troca de informação permanente.
A CMVM tem vindo fazer um ponto da situação do caso, o que não acontece com o Banco de Portugal. O silêncio absoluto do banco central é, na sua opinião, positivo para a credibilidade do sistema financeiro?
Enquanto as investigações não estiverem terminadas, o estado normal é serem mantidas em sigilo. Por razões próprias da nossa supervisão, tivemos a preocupação de, em Dezembro, perante dados seguros, esclarecer o mercado e os investidores, que até iam ser chamados a eleger órgãos sociais numa assembleia geral. Esse foi o primeiro momento em que falámos. Depois só voltámos a falar quando os processos começaram a ficar concluídos. Não temos dito muito mais, no essencial dissemos tudo em Dezembro.

Mas na véspera da última AG do BCP não disseram tudo em relação à KPMG…
Informámos que não tínhamos ainda concluído o processo de supervisão à KPMG e que, por isso, não havia factos novos sobre essa matéria. Recordo que tinha prometido que se os houvesse, daríamos conhecimento aos accionistas antes da assembleia geral.
Mas os accionistas foram para a AG sem qualquer elemento, votaram e reelegeram a KPMG…
É um direito que lhes assiste plenamente. Tínhamos dito que iríamos acelerar o processo para o caso de haver informação útil a dar. O que fizemos na véspera da AG – estivemos até ao último dia a tentar saber se tínhamos informações úteis a dar – foi pedir ao presidente da mesa que informasse os accionistas. E isto até por solicitação de accionistas que nos faziam perguntas sobre esta matéria, perguntando se tínhamos alguma coisa a dizer. O que fizemos foi dizer “ainda não temos”. A única coisa que tínhamos para dizer é que houve um reajustamento às contas, aceite pelos próprios auditores. Quanto à responsabilidade que os auditores possam ter tido nestas situações, ainda não temos dados suficientes.

Mas acha prudente que o auditor tenha sido reeleito?
Os accionistas é que decidem. A nossa intenção foi transmitir aos accionistas os riscos conhecidos. Foi dito apenas que havia riscos, ninguém disse que a KPMG não podia ser eleita. E os accionistas entenderam reeleger a auditora. Respeitamos integralmente a vontade dos accionistas. Se vier a surgir algum problema, os accionistas tirarão as suas consequências.

Quando prevêem concluir as investigações ao papel da KPMG?
Penso que muito em breve. Não gostaria de passar do fim do Verão sem estes assuntos todos tratados, no que compete à CMVM.

Sobre a KPMG, existem indícios de práticas menos lícitas?
Não lhe posso dizer isso, seria antecipar a conclusão que ainda não temos.

Gostou dos comentários e críticas deixadas pelo presidente da mesa da AG do BCP, Menezes Cordeiro, à CMVM na última assembleia geral do banco?
Esses casos deixam-nos sempre com alguma pena e causam-me grande perplexidade. O presidente da mesa tem como missão defender os interesses de todos os accionistas, mas é do interesse de todos ter acesso a toda a informação existente, quer gostem ou não dela. E a informação que a CMVM tinha a dar era aquela. A informação não tinha como objectivo, como é evidente, impedir que os accionistas tomassem as suas decisões ou sequer condicioná-las, mas que as tomassem na posse de toda a informação existente no momento. Sempre respeitámos a opinião do presidente da mesa, a quem compete aplicar a lei, mesmo que não concordemos com a sua opinião. Por exemplo, temos grandes dúvidas em relação ao facto de ele não ter permitido que os accionistas apresentassem uma proposta alternativa para os auditores porque entendemos que a soberania dos accionistas em assembleia geral é absoluta. Aliás, todo o nosso sistema jurídico se encaminha no sentido da prevalência da soberania dos accionistas. Respeitámos a opinião do presidente da mesa e ele deve respeitar os pedidos da CMVM de informação aos accionistas e transmiti-los de forma objectiva, o que não aconteceu. Isso é pena porque a CMVM não tem nenhum interesse próprio. Pedimos com honestidade intelectual, que fosse transmitida uma informação e é nosso entender que o senhor presidente da mesa se deveria ter limitado a transmiti-la com o mesmo rigor intelectual e evitar os comentários que, além do mais, foram pouco respeitosos para com um órgão de supervisão.

A CMVM alguma vez se sentiu pressionada ou condicionada no âmbito deste processo?
Não e tenho de dizê-lo com toda a linearidade e sem qualquer qualificativo. Todas as partes envolvidas foram absolutamente correctas.

Conhece muita gente, eventualmente, será mesmo amigo de pessoas das empresas que supervisiona. O que aconteceria se alguém, de uma forma completamente informal, lhe dissesse “Oh Carlos, dá lá um jeitinho”? Fingiria que a conversa não tinha acontecido, denunciaria…
Acho que isso nunca aconteceu nem virá a acontecer porque as pessoas sabem que eu não dou o jeitinho.

A CMVM tem sido criticada na sua acção de supervisão, havendo mesmo quem diga que indicia a culpa antes do julgamento. Concorda?
A verdade é que não tem havido muitas críticas nesse sentido. Os casos pontuais de que me recordo provêm normalmente de pessoas visadas em processo ou de advogados a eles ligados. Não se pode dizer que sejam imparciais… A CMVM actua no estrito cumprimento da lei e dentro dos seus limites, respeitando os direitos de defesa dos visados. Mas uma coisa é o julgamento dos possíveis infractores, outra são os factos que apuramos e que, se devidamente fundamentados e documentados, não poderão ser negados. Foi o que se passou no caso BCP quando, em finais de Dezembro, fizemos publicar as conclusões preliminares de uma investigação, para que os accionistas e o mercado fossem devidamente informados. Essas conclusões – hoje ainda reforçadas – limitaram-se a reportar situações factuais, e só isso. O julgamento das culpas e as penalizações correspondentes estão agora a ser feitos. Mas é impossível negar o que efectivamente aconteceu e que não nos oferece dúvidas...

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DEVE-SE LUTAR SEMPRE PELA VERDADE NO BCP....................... "A crise aperta, a crise é forte, a crise é farta, mas algumas instituições bancárias acharam que o melhor era enterrar ainda mais os endividados na lama". Pedro Ivo Carvalho, "Jornal de Notícias", 28-11-2009